quinta-feira, 24 de abril de 2008


A paixão segundo G.H. - Clarice Lispector - 1964

A escultora G.H. nos conta sua experiência vivenciada a partir do instante em que entra no quarto da ex-empregada, vê o surgimento de uma barata no guarda-roupa e a esmaga na porta. Daí em diante, tomada por uma mistura de medo e repulsa, G.H. vive com a barata durante horas e horas a sensação de ter perdido a sua "montagem humana". A incapacidade de dar forma ao que lhe aconteceu, a aceitar este estado de perda, a leva a imaginar que alguém está segurando a sua mão. Desta maneira, o leitor passa a viver junto com a personagem esta experiência singular.

Diz a epígrafe da obra de Bernard Berenson: "Uma vida plena pode ser aquela que alcance uma identificação tão completa com o não-eu que não haja mais um eu para morrer".

Sem nome, G.H. identifica-se com todos os seres. Entre suas vidas possíveis está a mística, aberta a múltiplos temas, como a linguagem e a arte que se fundem na busca espiritual.

O momento de maior revelação se dá na cena mais famosa de romance. A barata, após perder sua casca, expele a secreção branca que aparece como sua última essência. G.H., então, a come. Estaria aí a renúncia que a personagem faz a seu próprio ser como linguagem, que, logo após o ato, entrega-se ao silêncio.

domingo, 13 de abril de 2008

A escritora e a obra

No caminho da minha preparação para iniciar esta leitura... caminho esse que envolve outros livros, outros estilos, como se estivesse a adocicar a compreensão do que aí vem, encontrei algumas luzes. Aconselho o mesmo.

Assim:

«Clarice Lispector, nascida em Tchetchelnik, a 10 de dezembro de 1920, foi uma escritora brasileira nascida na Ucrânia.

De família judaica, recebeu o nome de Haia Lispector. Nasceu durante a viagem de emigração da família ao continente americano. Aportaram no Brasil quando tinha pouco mais de um ano de idade.

Por iniciativa de seu pai, à exceção de uma irmã, todos mudaram de nome, Haia passou a Clarice.

Clarice Lispector começou a escrever logo que aprendeu a ler, na cidade do Recife, onde passou parte da infância.

Em 1944 publicou seu primeiro romance, Perto do coração selvagem. A literatura brasileira à data dessa publicação era dominada por uma tendência essencialmente regionalista, retratando a difícil realidade social do país na época. Clarice Lispector surpreendeu a crítica com seu romance, quer pela problemática de caráter existencial, completamente inovadora, quer pelo estilo solto elíptico, e fragmentário, que críticos reputaram reminiscente de James Joyce e Virginia Woolf, se bem que ainda mais revolucionário.

A obra de Clarice ultrapassou qualquer tentativa de classificação. A escritora e filósofa francesa Hélène Cixous vai ao ponto de dizer que há uma literatura brasileira A.C. (Antes da Clarice) e D.C. (Depois da Clarice).»

«Em "A Paixão Segundo G.H." os fluxos de consciência permeiam o livro. Espécie de romance-enigma, fornece o lugar de sujeito à linguagem, que constrói ao redor de si um labirinto cuja saída está na essência do ser: trata-se de um longo monólogo em primeira pessoa, que se dá pelo "jorro turbilhante e ininterrupto de linguagem". Um paradoxo, como muitos dos que permeiam a obra da escritora: as palavras são, ao mesmo tempo, o que afasta o ser de sua essência, mas, ao mesmo tempo, constitui a chave para atingi-la. É o exercício da linguagem como instrumento possível de se tocar o intocável, de se atingir o segredo: desenterrar o melhor e o pior de nossa condição humana, que já não é nem mais humana.»

Clarice Lispector

Passei por aqui só para começar um pouco a ambientar a leitura do próximo livro. Estava a pesquisar na net algumas coisas sobre esta escritora e algumas das suas obras e encontrei esta declaração feita pela própria:
"Eu escrevo sem esperança de que o que eu escrevo altere qualquer coisa. Não altera em nada... Porque no fundo a gente não está querendo alterar as coisas. A gente está querendo desabrochar de um modo ou de outro..."

O que será que "A Paixão Segundo GH" vai trazer de novo? O que é que vai alterar? Que tipo de linguagem usará para alterar qualquer coisa? Que mundo? O de cada um de nós? Como se irá revelar aos nossos olhos a possibilidade dessa alteração?
Será mais um livro de paixão ou ódio... ou passará ao largo das nossas vidas enquanto leitores pela sua indiferença?

Ainda não o li, mas já comecei a perceber que é polémico...

segunda-feira, 3 de março de 2008

Yasunari Kawabata



Yasunari Kawabata (Osaka, Honshu, 14 de Junho de 1899 – Zuschi, 16 de Abril de 1972), escritor japonês, foi o primeiro japonês a ser laureado com o Prémio Nobel da Literatura, em 1968.

Infância
Enquanto criança, Kawabata desejara vir a tornar-se pintor mas optou por tornar-se escritor após publicar alguns contos durante o tempo em que frequentava o liceu. Ainda jovem foi marcado por acontecimentos trágicos ficando órfão com três anos. Perdeu a avó com apenas sete anos, a irmã com nove anos e o avô com catorze.

Juventude
Estudava Literatura na Universidade Imperial de Tóquio quando formou, juntamente com Yokimitsu Riichi, um jornal de letras, Bungei Jidai – que ajudava a promover um novo movimento literário (Shinkankakuha) que, segundo Kawabata e Yokomitsu, tinha como principais preocupações a apresentação de “novas sensações” na literatura.
Kawabata começou a ganhar reconhecimento com alguns contos publicados após graduar-se, vindo a ser finalmente aclamado em 1926 com “Izu no Odoriko” (“A Dançarina de Izu”, em Portugal), uma história que explorava o erotismo do amor juvenil.

Idade adulta
O seu primeiro romance foi Yukiguni (“Terra de Neve” em Portugal), começado em 1934 e publicado gradualmente de 1935 a 1937. “Terra de Neve” é uma história de amor entre um homem diletante da cidade de Tóquio e uma gueixa de uma povoação remota onde este encontra um refúgio do stress da sua vida citadina. Este romance colocou Kawabata imediatamente na posição de um dos escritores japoneses mais importantes e promissores, tornando-se o romance num clássico instantâneo que é, hoje, considerado uma das suas mais importantes obras-primas.
Após o final da Segunda Guerra Mundial Kawabata continuou a publicar romances como Senbazuru, Yama no Oto, “A Casa das Belas Adormecidas”, Utsukushisa to Kanashimi to e Koto (“Kyoto” em Portugal). No entanto o romance que Kawabata considerava ser o seu melhor foi Meijin, publicado entre 1951 e 1954.
Kawabata foi ainda presidente do Pen Club japonês por muitos anos após a guerra.
Apesar de, no seu discurso de aceitação do Prémio Nobel, ter condenado a prática do suicídio, acabou por fazê-lo em 1972, dois anos após o suicídio por seppuku de Yukio Mishima, de quem é considerado mentor.

Estilo
O estilo de escrita de Yasunari Kawabata distingue-se por uma linguagem suave, mais abstracta que descritiva, onde predomina a subjectividade em relação à objectividade, aproximando-se muitas vezes da prosa poética.

Títulos mais importantes
A Dançarina de Izu (伊豆の踊り子 Izu no Odoriko 1926)
Terra de Neve (雪国 Yukiguni, 1935-1937, 1947)
The Master of Go (名人 Meijin, 1951-4)
Thousand Cranes (千羽鶴 Senbazuru, 1949-52)
The Sound of the Mountain (山の音 Yama no Oto, 1949-54)
The Lake (湖(みづうみ) Mizuumi, 1954)
A Casa das Belas Adormecidas (眠れる美女, 1961)
Kyoto (古都 Koto, 1962)
Palm-of-the-Hand Stories (掌の小説)
Beauty and Sadness (美しさと哀しみと Utsukushisa to Kanashimi to, 1964)

Títulos traduzidos para português
Dançarina de Izu — Vega Editora
Terra de Neve — Dom Quixote
Chá e Amor — Vega Editora
A Casa das Belas Adormecidas — Assírio & Alvim
Kyoto — Dom Quixote e Estação Liberdade
Mil Tsurus — Estação Liberdade
Beleza e Tristeza — Editora Globo - tradução a partir do inglês.

Terra de Neve



Terra de Neve — ou O País das Neves, no Brasil— (em japonês, 雪国), publicado no foi o primeiro romance do Prémio Nobel japonês Yasunari Kawabata.

A narrativa - durante a qual pouco ou nada parece acontecer - passa-se numa pequena povoação gelada, isolada na costa oeste do Japão, para onde um homem de negócios da cidade de Tóquio, Shimamura, viaja esporadicamente, sozinho, para encontrar alguma paz. Aí conhece a gueixa Komako e com ela desenvolve uma relação subtil mas complexa, algures entre o respeito mútuo, a amizade e o amor.
Terra de Neve é considerado um dos romances mais belos da literatura do século XX pelo emprego delicado da linguagem e pela maneira como retrata as relações humanas de uma forma notavelmente subtil, intensa e original.

O livro teve duas adaptações para o cinema, em 1957 e 1965, ambas chamadas Yukiguni.